A
mediação no conflito entre os Estados Unidos e Cuba, que permitiu a
reconciliação após meio século de tensões, é uma das principais ações
diplomáticas do papa Francisco, que também tem acompanhado conversações na
Colômbia ou na Venezuela.
No final de 2014, Washington e
Havana anunciaram o restabelecimento das relações diplomáticas, num processo
que contou com a mediação do Vaticano.
Francisco saudou o fim do
“silêncio recíproco” entre os Estados Unidos e Cuba, dois países que citou como
exemplo das “pontes construídas” pelo diálogo.
O então Presidente
norte-americano, Barack Obama, saudou
o “papel precioso” do papa neste processo, apesar de Francisco ter garantido que
a aproximação se deveu à boa vontade dos dois países e não por causa da
mediação.
Quanto ao conflito na Colômbia,
o líder da Igreja Católica promoveu um diálogo no Vaticano entre o Presidente,
Juan Manuel Santos, e o seu antecessor, Álvaro Uribe, que contesta o acordo de
paz com a guerrilha das FARC, mas sem conseguir sanar as divergências.
O Vaticano acompanhou as
conversações na Venezuela, no final do ano passado, entre a Mesa de Unidade
Democrática (MUD, aliança opositora) e o Governo de Nicolás Maduro, mas que
foram interrompidas, sem acordo.
Em 2014, juntou-se ao presidente
de Israel, Shimon Peres, e ao presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud
Abbas, numa oração pela paz no Médio Oriente, dias depois da sua primeira
viagem à Terra Santa.
Em novembro de 2015,
deslocou-se à República Centro-Africana, país onde milícias de inspiração
cristã e muçulmana se opõem num conflito sangrento. Na ocasião, visitou a
mesquita na capital, Bangui, onde recordou que cristãos e muçulmanos são
“irmãos” e pediu que acabem com a violência no país.
A guerra na Síria tem merecido
várias referências de Francisco, que repete apelos ao cessar-fogo e pedidos à
comunidade internacional para que trabalhe no sentido de avançar com
“negociações sérias, que ponham definitivamente fim a um conflito que está a
provocar um verdadeiro desastre”.
Principais marcas do
pontificado de Francisco
Principais marcas do
pontificado de Francisco, eleito a 13 de março de 2014:
Reforma da Cúria
A reforma da Cúria Romana (o
governo da Igreja Católica), implicando a sua modernização, fusão de serviços e
transparência, era uma das questões mais prementes do conclave que elegeu Jorge
Bergoglio, mas algumas medidas têm encontrado resistência interna. A reforma,
avisou, “não tem fins estéticos”.
O papa tem nomeado cardeais de
países que nunca tinham tido representação no colégio cardinalício, alargando
assim a diversidade, além de terem menos de 80 anos, o que lhes permite eleger
um novo papa e participar no conclave.
Além disso, criou comissões
para reformar a organização econômica do Vaticano ou para rever o funcionamento
do Instituto para as Obras de Religião, conhecido como Banco do Vaticano.
O papa também tem criticado a
atuação de membros do clero, quando recorda que a Igreja deve servir os outros
e não servir-se a si própria.
“Como eu gostaria de uma Igreja
pobre, para os pobres”, desabafou. Noutro momento, disse: “Os padres e as
freiras têm de ser coerentes com a pobreza. Quando vemos que o primeiro
interesse de uma instituição paroquial ou educativa é o dinheiro, isto é de uma
grande incoerência”.
“Esta economia mata”
É uma das ideias mais fortes do
seu pontificado, que referiu na sua exortação apostólica ‘Evangelii Gaudium’,
em 2013, e que tem servido para ilustrar as suas críticas aos efeitos da crise
econômica.
“A crise que estamos a viver é
a crise da pessoa, que já não conta; só o dinheiro conta”, disse, numa ocasião,
e, noutro momento, comentou: “O [sem-abrigo] que morre não é notícia, mas se as
bolsas caem 10 pontos é uma tragédia. Assim, as pessoas são descartadas”.
Repetidamente, o papa manifesta
a sua preocupação com os pobres, os desempregados, enquanto condena a
acumulação do lucro e o culto do dinheiro.
Clima
É uma das principais
preocupações assumidas pelo papa, que dedicou a sua primeira encíclica, ‘Laudato
Si’ (‘Louvado Sejas’), ao tema.
Francisco já avisou que o mundo
está “à beira do suicídio” devido às alterações climáticas.
Pedofilia
O papa reforçou as normas de
expulsão dos bispos que sejam negligentes em relação aos abusos sexuais de
menores ou adultos vulneráveis, e pediu “tolerância zero”.
Francisco condenou a traição
dos padres pedófilos, que “roubam os inocentes da sua dignidade”.
“Devemos ser muito duros [com
crimes de pedofilia praticados por alguns padres]! Com as crianças não se
brinca”, declarou.
No entanto, o trabalho da
Comissão Pontifícia para a Proteção dos Menores voltou a ser criticado, com a
irlandesa Marie Collins, ela própria vítima, enquanto criança, de abusos
sexuais cometidos por um padre, a demitir-se com acusações de “falta de
cooperação ” do Vaticano.
Refugiados e migrantes
Em diversas ocasiões, Francisco
criticou duramente a falta de atenção que a Europa presta aos migrantes e
refugiados, acusando os europeus de terem uma “consciência insensível e
anestesiada”, quando os mares Mediterrâneo e Egeu se transformaram “num
cemitério insaciável”.
O papa lamentou que sejam
destinadas “somas escandalosas” de dinheiro para salvar bancos em dificuldades,
mas que não se invista “nem uma milésima parte” na ajuda a refugiados e
migrantes.
Questões morais e de família
O papa tem acentuado a
necessidade de observar “as condições” da vida de cada um e de a Igreja ter
“misericórdia”, mais do que pôr a tônica somente nas doutrinas.
“A Igreja não pode insistir
apenas sobre as questões relacionadas com o aborto, o casamento homossexual e o
uso de métodos contraceptivos”, defendeu.
O último ano do seu pontificado
ficou marcado pela polêmica em torno da exortação apostólica ‘Amoris Laetitia’
(‘A Alegria no Amor’), na qual ‘abre a porta’ à comunhão para os católicos
divorciados e numa segunda união.
O cardeal norte-americano
Burke, uma proeminente figura conservadora, atuou como ligação do Vaticano com
a Ordem de Malta, desde que foi marginalizado de papéis mais importantes pelo
papa em 2014, mas Francisco afastou-o recentemente dessa posição depois de ter
estado envolvido na problemática saída de um membro desta organização
internacional católica.
Jorge Bergoglio também
reafirmou a não condenação dos homossexuais: “Se uma pessoa é
homossexual e procura Deus, quem sou eu para julgá-la?”.
Quanto ao aborto, o papa
autorizou todos os sacerdotes a manterem definitivamente a capacidade de
absolverem as mulheres que fizeram um aborto, disposição que devia vigorar
apenas durante o ano jubilar da misericórdia, que terminou em novembro de 2016.
Maior abertura da Igreja Católica
O papa tem insistido na
necessidade de atribuir postos-chave a mulheres e leigos, no âmbito da reforma
do Governo da Igreja de Roma, e anunciou a intenção de criar uma comissão para
estudar a possibilidade de as mulheres acederem ao diaconado.
Além disso, Francisco sugeriu
recentemente a possibilidade de ordenar homens casados, em particular em locais
onde há escassez de padres.
Ecumenismo e diálogo inter-religioso
O diálogo inter-religioso tem
sido outra marca do pontificado de Francisco.
No início do ano passado, pediu
aos crentes que rezem por um diálogo inter-religioso, que leve à paz e justiça
no mundo.
“Muitos pensam de forma
diferente, sentem diferente, procuram Deus e encontram Deus de outra forma.
Nesta multitude, neste leque de religiões há uma única certeza: todos somos
filhos de Deus”, declarou.
Em fevereiro de 2016, o papa
Francisco e o patriarca ortodoxo russo Kiril deram um abraço, naquele que foi o
primeiro encontro dos líderes das duas Igrejas após o cisma de 1054, e
assinaram uma declaração conjunta por causa da perseguição aos cristãos no
Médio Oriente e África do Norte.
Francisco também já se reuniu
com Ahmed Al Tayeb, o imã da universidade islâmica do Cairo Al Azhar, um
importante centro sunita, para abordar o compromisso das autoridades e fiéis
das grandes religiões na “rejeição da violência e do terrorismo”.
Com os muçulmanos, Francisco
teve já muitos gestos de aproximação. Logo na primeira Quinta-Feira Santa do
seu pontificado, lavou os pés a mulheres muçulmanas presas numa prisão nos
arredores de Roma.
Na sua primeira viagem, à ilha
italiana de Lampedusa, local de chegada de milhares de refugiados e migrantes,
fez uma alusão ao Ramadão.
Em 2016, quando visitou a ilha
de Lesbos (Grécia), levou para o Vaticano três famílias muçulmanas. E, ainda no
final de março, visitou a casa de uma família muçulmana em Milão.
Dias depois da sua primeira
viagem à Terra Santa, em 2014, juntou-se ao presidente de Israel, Shimon Peres,
e ao presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, numa oração pela paz
no Médio Oriente.
Em julho do ano passado, o papa
visitou o campo de concentração de Auschwitz, na Polónia, a pé, sozinho e em
silêncio, onde rezou durante cerca de dez minutos. No final, escreveu no livro
de honra: “Senhor, tende piedade do teu povo, Senhor, perdoa tanta crueldade”.
Terrorismo
Francisco condenou, em várias
ocasiões, o terrorismo, que recusa associar ao Islão: o fundamentalismo é “uma
doença de todas as religiões”, incluindo da Igreja Católica Romana, que tem
“alguns, até muitos, fundamentalistas”.
“Muitos [muçulmanos] dizem-me:
não somos assim, o Alcorão é um livro de paz, é um livro profético de paz, isto
não é o Islamismo. Ouço isso e sinceramente não posso dizer que todos os
muçulmanos são terroristas”.
Francisco condena a “loucura
homicida” do terrorismo e apela ao diálogo inter-religioso.
A guerra na Síria
mereceu vários lamentos do papa, que apelou ao “cessar-fogo imediato” para
permitir a saída dos civis das zonas atingidas.
Fonte: Diário de Notícias / Blog
do Carmadélio
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